sábado, 3 de dezembro de 2011

EU NÃO GOSTO DE PAPAI NOEL, E VOCÊ?!

Não gosto de você, Papai Noel!


Também não gosto desse seu papel

de vender ilusões à burguesia.

Se os garotos humildes da cidade

soubessem do seu ódio à humildade,

jogavam pedras nessa fantasia!



Você talvez nem se recorde mais.

Cresci depressa e me tornei rapaz,

sem esquecer no entanto o que passou.

Fiz-lhe bilhete pedindo um presente,

a noite inteira eu esperei contente,

chegou o sol e você não chegou.



Dias depois, meu pobre pai cansado

trouxe um trenzinho velho, empoeirado,

que me entregou com certa hesitação.

Fechou os olhos e balbuciou:

"É pra você... Papai Noel mandou..."

E se esquivou contendo a emoção.



Alegre e inocente nesse caso,

pensei que meu bilhete com atraso

chegara às suas mãos no fim do mês.

Limpei o trem, dei corda, ele partiu,

deu muitas voltas, meu pai sorriu

e me abraçou pela última vez.



O resto só eu pude compreender

quando cresci e comecei a ver

todas as coisas com realidade.

Meu pai chegou um dia e disse, a medo:

"Onde é que está aquele seu brinquedo?

Eu vou trocar por outro na cidade".



Dei-lhe o trenzinho quase a soluçar,

e como quem não quer abandonar

um mimo que lhe deu quem lhe quer bem,

disse medroso: "Eu só queria ele...

Não quero outro brinquedo, quero aquele

E por favor, não vá levar meu trem".



Meu pai calou-se e pelo rosto veio

descendo um pranto que eu ainda creio,

tão puro e santo, só Jesus chorou.

Bateu a porta com muito ruído,

mamãe gritou, ele não deu ouvidos,

saiu correndo e nunca mais voltou.



Você, Papai Noel, me transformou

num homem que a infância arruinou,

Sem pai e sem brinquedos. Afinal,

dos seus presentes, não há um que sobre

para a riqueza do menino pobre

que sonha o ano inteiro com o Natal!



Meu pobre pai doente, mal vestido,

pra não me ver assim desiludido,

comprou por qualquer preço uma ilusão:

num gesto nobre, humano, decisivo,

foi longe pra trazer-me um lenitivo,

roubando o trem do filho do patrão.



Pensei que viajara. No entanto

depois de grande, minha mãe, em pranto,

contou que fora preso. E como réu,

ninguém a absolvê-lo se atrevia.

Foi definhando, até que Deus um dia

entrou na cela e o libertou pro céu!

(Aldemar Paiva)